sexta-feira, 10 de abril de 2009

Mensagem para o empresário Belmiro Vianez Filho

Foto: Rogelio Casado - Ecossistema do Encontro das Águas - Manaus-Am, 2009
A AMANA, democraticamente, conclama o empresário Belmiro Vianez Filho, a abrir espaço a qualquer hora e em qualquer lugar para ouvir os (des)informados que lutam contra a construção do Porto das Lajes. Estamos certos de que seu pai, Belmiro Vianez, tal qual o pai de Renato Simões (grupo Coca-Cola), não apoiariam um empreendimento que fere o principal cartão postal da capital do estado do Amazonas, Manaus. Não somos contra a construção de portos, nem fazemos o jogo dos que praticam extorsão comercial. Para tanto, acreditamos que existem outros lugares para construção de portos, como acreditamos que existem instituições idôneas capazes de realizar relatórios de impactos ambientais e sociais mais fidedignos. Finalmente, com sua ajuda e de outros empresários conscientes, queremos um parque de conservação do Encontro das Águas, com qualificação da população residente nas proximidades do lago do Aleixo em atividades que respeitem a vocação da região: turismo. Estamos certos de que lucrariamos todos.

***

Leia o texto publicado no rodapé da coluna Na Mira do Belmiro.

O Porto e a desinformação - O cientista José Alberto Machado, ex-superintendente adjunto da Suframa e animador da iniciativa do Porto das lajes, deu uma aula sobre o assunto na FEAM para empresários e parlamentares, detalhou sua importância, necessidade e urgência e denunciou a desinformação sobre o projeto para explicar a celeuma reinante, que só beneficia os defensores das taxas portuárias abusivas atualmente praticadas em Manaus. As mais caras do país.

(*) Belmiro é empresário e membro do Conselho Superior da Associação Comercial do Amazonas.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Abaixo assinado pelo tombamento do Encontro das Águas

Foto: Rogelio Casado - SOS Encontro das Águas - Manaus-Am, 15.02.2009

Amigos(as)

Desde ontem está disponível neste blog um abaixo-assinado contra a construção do porto das Lajes e pelo tombamento do Encontro das Águas do rio Negro com o rio Solimões, como patrimônio paisagístico e cultural dos amazonenses, dos brasileiros e da humanidade. Permitir sua destruição é como se permitisse a destruição, por exemplo, do Corcovado, da Chapada Diamantina, importantes patrimônios naturais do Brasil.

Os blogueiros que quizerem contribuir podem fazer link para seus blogues. A comunidade do lago do Aleixo, os amazonenses, e os manauaras em particular, agradecem.

Rogelio Casado
P/Associação Amigos de Manaus - AMANA

Nota do blog: Há um espaço na lista do abaixo-assinado para você dar picica; não deixe de dar sua opinião. Assista, também, os vídeos do Movimento SOS Encontro das Águas; acesse-os na Barra de vídeo.

Comunidade do Aleixo contra a construção do Porto das Lajes

Comunidade do Aleixo contra a construção do Porto das Lajes

Desenvolvimento Sustentável - É o desenvolvimento que satisfaz as necessidades das gerações presentes sem comprometer o atendimento das necessidades das gerações futuras.

Sustentabilidade - É um comprometimento ambiental com a gestão adequada do desenvolvimento econômico. OK!

Em carta escrita pelo presidente Lula e distribuída publicamente durante a campanha pelo seu 2º mandato (carta essa muito bem guardada até hoje por muitos brasileiros, principalmente, pelos amazonenses), o presidente deixa bem claro que ele e sua equipe têm um programa de governo específico para a Amazônia, cuja região terá uma importância estratégica pelo fato da Amazônia ser um patrimônio do povo brasileiro, cujo futuro deve ser definido pelo povo amazônico.

Segundo o presidente Lula, a economia do Amazonas, assim como de toda a Amazônia, precisa ser estimulada e em seu governo os segmentos produtivos receberão o apoio necessário para colocar em prática inovações produtivas modernas e harmonizadas com a qualidade ambiental da zona rural e urbana. Para concluir, o presidente cita em sua carta, que o PT, tem uma experiência muito feliz com o desenvolvimento sustentável e que irá aprofundá-la nos estados da Amazônia. Muito bem!

Porém, no Estado do Amazonas, a situação é diferente. Para muitos habitantes deste grandioso e promissor Estado brasileiro, como por exemplo, os moradores das várias comunidades que formam a grande e populosa Colônia Antônio Aleixo, bairro Bela Vista e adjacências, para esses citados moradores, Desenvolvimento Sustentável e preservação ambiental só existem na mídia, e como pretexto para adquirir verba. Se o Governo Federal está contribuindo com a obra de implantação de um porto para carga, descarga e armazenamento de contêineres, o presidente Lula precisa ser informado do seguinte:

O ponto turístico mais famoso do Estado do Amazonas que é o magnífico Encontro das Águas e o belíssimo Lago do Aleixo, localizados um em frente ao outro (lago esse que o presidente conheceu quando veio inaugurar o conjunto habitacional Amine Lindoso/ Cidadão II), em Manaus, no bairro 11 de Maio, Colônia Antônio Aleixo), estes dois citados pontos turísticos estão ameaçados de extinção pela implantação do tal porto. E o que é mais grave, além de toda essa catástrofe ambiental que acontecerá na citada área, como ficará a vida da população das várias comunidades, situadas nos arredores deste mencionado local e que dependem das águas deste grande manancial que é o LAGO DO ALEIXO?

A citada população está mobilizada, tentando reverter essa absurda situação. Como é possível, que os governantes, que se dizem preocupados com as questões ambientais, sejam cúmplices desse desastre ambiental? Uma comissão, formada por moradores das comunidades que sofrerão com esse impacto, tentou chegar até ao governador do Amazonas, Eduardo Braga, para mostrar a ele a situação do referido lago e solicitar atendimento para as várias, antigas e repetidas reivindicações de benefícios para o Lago do Aleixo, porém não tiveram permissão para falar com o governador e nem para mostrar a filmagem que eles têm, porque exatamente nesse evento em que o governador se encontrava, ele ia ser premiado por ser o maior defensor da natureza e do meio ambiente na Amazônia (tendo um defensor desse, não precisa ter inimigo).

O Lago do Aleixo é imenso, é muito lindo e não pode morrer, e a citada população precisa dele para viver. Apesar de todo o descaso dos governantes para com essa importante questão ambiental, os moradores continuam sua luta por esse grande patrimônio da natureza e da humanidade.

Os mencionados moradores reivindicam junto às autoridades competentes, que o Lago do Aleixo seja declarado oficialmente: área de turismo, lazer, com a devida preservação ecológica, que o mesmo seja incluído no roteiro de visitação turística de Manaus, que seu magnífico visual seja divulgado para toda a sociedade. Essa é a forma para população saber da existência de tão belo lugar e visitá-lo quando e quantas vezes desejar.

Marisa Lima, comunitária do bairro do Aleixo, moradora do Lago do Aleixo

fonte: www.rogeliocasado.blogspot.com

Ciência para o enriquecimento do ser humano

Lago do Aleixo - Manaus-Amazonas-Brasil
Nota do blog: Enquanto o Fórum Mundial Ciência e Democracia, realizado em Belém-PA, trabalha por uma ciência que enriqueça o ser humano, em Manaus os responsáveis pela proposta de construção do Porto das Lajes no Encontro das Águas (símbolo da cultura e da identidade dos amazonenese) dão um péssimo exemplo para as novas gerações. Por essa razão a Associação Amigos de Manaus - AMANA criou o movimento SOS Encontro das Águas em defesa do ecossistema ameaçado pela empresa Lajes S/A.

QUESTIONAMENTOS E DIRETRIZES ORIUNDOS DO
I FÓRUM MUNDIAL CIÊNCIA E DEMOCRACIA – BELÉM 26/1-1/2/2009


Preâmbulo

O presente texto é o resultado inicial do I Fórum Mundial Ciência e Democracia realizado em Belém de 26 de janeiro a 1º de fevereiro de 2009. Foi elaborado e subscrito por participantes de 18 países em 4 continentes. Ele dá início a um processo amplo e inclusivo tendo por objetivo construir uma rede internacional de movimentos, organizações e indivíduos que compartilham questionamentos a respeito da ciência, da tecnologia, e de outras formas de conhecimento, à luz dos interesses sociais e democráticos.

Questionamentos e diretrizes

1. Todo conhecimento, inclusive a ciência, é herança comum da humanidade. Expandir o conhecimento tem sido uma das aspirações mais fundamentais da humanidade ao longo da história.

2. O conhecimento e os métodos de sua produção podem resultar tanto na emancipação e no bem de todos, como em dominação e opressão.

3. Apoiamos os regimes que garantem e promovem os bens públicos e comuns e outros sistemas de recompensa da inovação que não envolvem a criação de monopólios de conhecimento e geração de lucros.

4. A ciência e a tecnologia estão implicadas nas crises que assolam o mundo nos dias de hoje – a crise econômica, a ecológica, a energética e as relacionadas à segurança alimentar, à democracia, à guerra e ao militarismo. É necessário aprofundar nossa compreensão a respeito de como a ciência e a tecnologia são parte tanto das causas quanto das possibilidades de superação dessas crises.

5. É necessário reconhecer que os valores das comunidades científicas são moldados por processos históricos e culturais. A autonomia e a responsabilidade social dos pesquisadores, bem como o caráter público e universal da ciência, precisam ser promovidos, porém levando em conta as diversidades sociais e culturais do tempo presente.

6. Reconhecemos que em diferentes países, e em diversos níveis, incluindo o das instituições científicas e o das comunidades locais, existem diferentes regimes de produção do conhecimento. Os contextos históricos influenciam os desenvolvimentos políticos, culturais, educacionais e científicos na sociedade, dando origem à diversidade na produção do conhecimento tanto científico quanto tradicional. É necessário um novo tipo de sistema de eco-conhecimento adequado a diferentes regimes de propriedade intelectual. Nesse contexto apoiamos iniciativas como a do Acesso Aberto para as publicações científicas.

7. Devem ser promovidas iniciativas visando o envolvimento informado de cidadãos nos processos de tomada de decisões relativas às políticas científicas e tecnológicas em todos os níveis, internacional, nacional e local.

8. É necessário mudar a situação atual, em que os interesses do mercado, o lucro das empresas, a cultura consumista e os usos militares são os principais fatores determinantes dos rumos da pesquisa científica, tecnológica, e da inovação.

9. Adotamos a preservação da vida humana como um valor primordial, e assim conclamamos as comunidades científicas e tecnológicas a não se envolverem em pesquisas com fins militares.

10. É imprescindível promover a participação social e o empoderamento da população a fim de exercer o controle democrático sobre as políticas científicas e tecnológicas.

11. É necessário desenvolver sistemas de pesquisa colaborativos e participativos, de baixo para cima.

12. Temos por objetivo a construção de uma rede internacional que ressalte a importância da ciência e da tecnologia, mas questionando as tendências perigosas que elas manifestam nos dias de hoje em relação à democracia, ao meio ambiente, e à dinâmica da globalização capitalista.

13. Esta rede aberta deve incluir as comunidades da ciência e da tecnologia, e diversos movimentos sociais. Nosso objetivo é estabelecer um diálogo democrático e uma relação de colaboração entre organizações científicas e de cidadãos, e movimentos sociais.

14. A rede visa fortalecer os movimentos que questionam a maneira como a ciência e a tecnologia é dominada por interesses empresariais, privados, militares, políticos e estatais, que afetam os valores éticos e a produção do conhecimento científico e tecnológico.

O presente texto é dirigido a

· Cientistas, tecnólogos, acadêmicos, educadores e especialistas, e suas instituições no mundo todo;
· Povos indígenas, associações de agricultores, sindicatos e outros movimentos sociais e políticos, ONGs, organizações e instituições no campo da ciência e da tecnologia;
· Todos os participantes dos fóruns globais, regionais e locais;
· Autoridades internacionais, regionais, nacionais e locais em todo o mundo.

A ciência, a pesquisa, as tecnologias e inovações estão ligadas a questões amplas e importantes referentes ao futuro de nossas sociedades e do meio ambiente. Conclamamos todos, portanto, a estabelecer conexões concretas entre as respectivas agendas e prioridades políticas e o conteúdo deste documento.

Convidamos todas as organizações científicas e sociais, participantes dos Fóruns Sociais, e cidadãos no mundo todo a ampliar e fortalecer este movimento a partir de agora, de acordo com a seguinte agenda:

Janeiro de 2010: Fóruns regionais Ciência e Democracia
Janeiro de 2011: II Fórum Mundial Ciência e Democracia

Conclamamos todas as pessoas, e todas as organizações, movimentos e redes, a organizar debates públicos a fim de conscientizar a maior parte de nossas respectivas sociedades e comunidades a respeito dessas questões.

Belém do Pará, 1º de fevereiro de 2009.

O porto das Lajes e o racismo ambiental

Comunidade do lago do Aleixo, em época de cheia dos rios

Racismo ambiental

Por Rogelio Casado


O movimento social SOS Encontro das Águas enfrenta o racismo ambiental gerado pela construção do porto das Lajes. A resistência da sociedade civil organizada em defesa da cidadania (e do ecossocialismo) leva seus militantes a recorrer à Rede Brasileira de Justiça Ambiental

Os eixos da luta contra o porto das Lajes

O ponto de partida da luta do movimento social SOS Encontro das Águas contra a construção do porto das Lajes, próximo ao encontro das águas do rio Negro com o rio Solimões, não poderia deixar de envolver dois eixos: a agressão ao meio ambiente, com impactos sobre a reprodução dos peixes que serve à população local, e a agressão ao patrimônio paisagístico, com repercussões inevitáveis sobre a auto-estima dos amazonenses, e dos manauaras em particular, ao ser privatizado e destruído um dos símbolos da sua identidade cultural.

De símbolo em símbolo, no contínuo exercício de análise sobre os impactos ambientais e sociais que o porto inevitavelmente provocará no lago do Aleixo, em cujo entorno habitam 40 mil pessoas, recorremos à história para melhor compreender o que levou um grupo de cidadãos da sociedade civil organizada a abraçar a luta da comunidade contra esse e outros empreendimentos que vêm danificando o ambiente onde vivem.

Leprosário

Os moradores originais daquele território, em passado recente, limitavam-se aos cidadãos hansenianos internados na Colônia Antônio Aleixo, além dos familiares que vinham de todos os cantos do Amazonas para ficar próximos dos parentes. Alguns deles não tiveram tempo para viver a infância, passando da meninice para a velhice sem os ritos sociais conhecidos.

Francisco, pescador que embarcou na Caravana das Águas, no dia 15 de fevereiro, em protesto contra a construção do porto, relata que veio do rio Purus para morar na Colônia no início dos anos 1970 para ficar perto do irmão que contraíra o “Mal de Hansen”. Lembra da beleza deslumbrante do lugar, mas sobretudo da fartura do peixe que compõe até hoje a mesa da população que explodiria no lugar, logo após a desativação da Colônia.

Antônio, outro pescador, lamenta que atualmente empresas como a SOVEL lancem produtos químicos no lago, ameaçando a vida dos peixes e dos humanos que deles se servem. Segundo ele, as redes de pesca ao serem retiradas da água vêm cobertas por uma camada espessa de produtos químicos utilizados no tratamento industrial do papel. Intuitivamente sabe do mal à saúde provocado pelos agentes tóxicos, e se tivesse tido à chance de ir à escola teria tido acesso ao conhecimento científico que ratifica o saber popular ao identificar os riscos que metais pesados oferecem à cadeia alimentar.

Em todos os depoimentos que tive oportunidade de ouvir uma chocante conclusão: a ineficiência do Estado em garantir o direito a viver em ambiente saudável (todo o entorno do Distrito Industrial, agora em expansão rumo ao território onde se encontra o lago do Aleixo, com seus inúmeros igarapés e lagos,está contaminado). Para os comunitários, é o abuso do poder econômico que tem livrado muitas empresas de cumprir com seus deveres. Algumas empresas punidas chegam a pagar multas, mas continuam a poluir o ambiente.

Podres poderes

Refletindo sobre a luta contra esses podres poderes, fiquei a pensar o que levaria cidadãos manauaras a sair dos seus cuidados, revitalizarem entidades de luta pela cidadania (pelo menos no que nos diz respeito às classes médias letradas, já que a comunidade do Aleixo há anos enfrenta o poder econômico com o auxílio da Igreja Católica), e enfrentar o capital predatório.

Lendo o sociólogo Gilberto Felisberto Vasconcellos não pude deixar de concordar com ele em sua abordagem do fascinante personagem que foi Darcy Ribeiro para a cultura da resistência contra o poder colonizador. Vale lembrar que nascemos do colonialismo; que nosso útero foi a colônia.

Pois bem. Darcy, que é um desses raros marxistas com experiência etnológica de campo, dizia que “o povo brasileiro é um povo enjeitado, que não era para existir, não foi mentalizado, não foi projetado, intencionalmente não fazia parte do desígnio dos colonizadores”. Significa dizer, segundo GFV, que: “Somos um produto inintencional. Um fruto recusado. Um resultado indesejado. Um filho da puta. O que os colonizadores queriam [...] é apenas uma feitoria lucrativa, ou seja, um entreposto comercial para produzir lucros exportáveis”.

Em sendo assim, só nos resta, mal rompe a manhã, como operários do futuro, recomeçar a luta por idéias e ideais de solidariedade, único meio de enfrentar os desígnios colonialistas ainda presentes na cultura das relações entre sociedade civil e sociedade empresarial, entre o cidadão e o Estado.

Um conceito para iluminar a luta social

Identificada a população atualmente residente no entorno da antiga Colônia Antônio Aleixo, em sua maioria migrantes pardos vindos do interior do estado do Amazonas, reconhecida a opção pela não submissão aos interesses neocoloniais, e mapeado os apoiadores e parceiros na luta pela preservação/conservação do ambiente, continuei intrigado com o fato de que aquele território seja tratado como a “cloaca da cidade”.

Por trás da presença histórica dos hansenianos, outrora estigmatizados por uma leitura religiosa perversa da condição humana, somada à expansão de empresas poluidoras do meio ambiente, lugar da pobreza sujeito à indiferença social, o que mais poderia estar oculto nesse cruel e simbólico espaço de exclusão?

Eis que nas minhas pesquisas em busca de outras brechas existentes no interior dos aparelhos de Estado que, a serviço da democracia, acolhessem as demandas cidadãs, me deparo com um conceito que caiu como um raio de luz.

Assim que li a expressão racismo ambiental, intui por associação de idéias o que, como e por que paira sobre a comunidade do Aleixo tantas agressões ambientais num só território, não por acaso território periférico de Manaus.

O conceito “racismo ambiental” se refere a qualquer política, prática ou diretiva que afete ou prejudique, de formas diferentes, voluntária ou involuntariamente, a pessoas, grupos ou comunidades por motivos de raça ou cor. Ora, ora! A maioria da população do entorno da Colônia Antônio Aleixo e do lago do Aleixo é composta por pardos migrantes do interior do estado do Amazonas. Mas, vamos adiante.

Robert Bullard, sociólogo e diretor do Environmental Justice Resource Center, afirma no artigo “Ética e racismo ambiental” (*) que a idéia de racismo ambiental “se associa com políticas públicas e práticas industriais encaminhadas a favorecer as empresas impondo altos custos às pessoas de cor. As instituições governamentais, jurídicas, econômicas, políticas e militares reforçam o racismo ambiental e influem na utilização local da terra, na aplicação de normas ambientais no estabelecimento de instalações industriais e, de forma particular, os lugares onde moram, trabalham e têm o seu lazer as pessoas de cor”. Caramba! Macacos me mordam se essa descrição não se ajusta às agruras vividas pela comunidade do Aleixo.

Robert diz ainda: “A tomada de decisões ambientais muitas vezes reflete os acordos de poder da sociedade (pre)dominante (negrito meu) e das suas instituições. Isto prejudica as pessoas de cor, enquanto oferece vantagens e privilégios para as empresas e os indivíduos das camadas mais altas da sociedade. A questão de quem paga e quem se beneficia das políticas ambientais e industriais é fundamental na análise do racismo ambiental”.

Quando recomendei recentemente, num outro artigo, a leitura do conceito de classe social, diante do que está em jogo nessa luta simbólica entre Davis e Golias, insisto que essa leitura é indispensável, sobretudo para nossos aprendizes de Direito Ambiental.

Racismo à brasileira

Se o conceito de racismo ambiental atira no que vemos, acerta no que é negado na pauta do debate público brasileiro: o racismo em território nacional. Senão vejamos: “O racismo ambiental fortalece a estratificação das pessoas (por raça, etnia, status social e poder), o lugar (nas cidades principais, bairros periféricos, áreas rurais, áreas não-incorporadas ou reservas indígenas) e o trabalho (por exemplo, se oferece uma maior proteção aos trabalhadores dos escritórios do que aos trabalhadores agrícolas)”, afirma Robert Bullard.

O autor de “Ética e racismo ambiental” é definitivo ao concluir que “o conceito institucionaliza a aplicação desigual da legislação; explora a saúde humana para obter benefícios; impõe a exigência da prova às “vítimas” em lugar de às empresas poluentes; legitima a exposição humana a produtos químicos nocivos, agrotóxicos e substâncias perigosas; favorece o desenvolvimento de tecnologias “perigosas”; explora a vulnerabilidade das comunidades que são privadas de seus direitos econômicos e políticos; subvenciona a destruição ecológica; cria uma indústria especializada na avaliação de riscos ambientais; atrasa as ações de eliminação de resíduos e não desenvolve processos precautórios contra a poluição como estratégia principal e predominante. A tomada de decisões ambientais e o planejamento do uso da terra em nível local acontecem dentro de interesses científicos, econômicos, políticos e especiais, de tal forma que expõem às comunidades de cor a uma situação perigosa. Isto é particularmente verdade no Hemisfério Sul e, também, no Sul dos EUA, região que foi convertida numa “área de sacrifício”; um buraco negro para os resíduos tóxicos. Fora disso, ela está impregnada pelo legado da escravidão e pela resistência braça à justiça eqüitativa para todos”.

Márcio Souza em seu livro “A expressão amazonense – do colonialismo ao neocolonialismo” nos lembra que a integração econômica da Amazônia foi feita em detrimento da história e da tradição locais. Essa arrogância não desapareceu com o regime militar. Novos tecnocratas estão a serviço do capital predatório.

Rede Brasileira de Justiça Ambiental

O conceito acima chegou-me às mãos graças ao trabalho de pesquisa como assessor da Associação Amigos de Manaus – AMANA, uma das entidades que lutam contra a privatização e destruição do Encontro das Águas pelo porto das Lajes.

Percorrendo meus e-mails, encontrei um enviado em novembro de 2008 pela companheira Socorro Papoula. Militante dos movimentos sociais, ela preside atualmente o Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher.

Tratava-se nada mais nada menos do que um comunicado da Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA), do qual participam os GTs Químicos e de Combate ao Racismo Ambiental, que me levou à pesquisa do conceito.

Santa coincidência! A RBJA está realizando um levantamento para a organização de um Mapa de conflitos envolvendo injustiça ambiental e Saúde no Brasil - um projeto elaborado pela Fase e executado pela Fiocruz, com o apoio do Departamento de Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde. Era só o que nos faltava!

O objetivo do formulário é recolher denúncias variadas, envolvendo injustiças ambientais e riscos para a saúde, se possível antes mesmo que o problema se torne uma ameaça real para as populações envolvidas. Além de disponibilizar essa informação para o Ministério e para as pessoas que têm o dever institucional de evitar que o problema se agrave, a RBJA estará igualmente socializando a questão entre as entidades da sociedade civil, possibilitando o monitoramento e a cobrança das ações governamentais a respeito.

Com a crescente adesão de entidades e cidadãos de boa vontade ao movimento social SOS Encontro das Águas, temos agora mais um instrumento na luta pela justiça ambiental.

A Associação Amigos de Manaus está encaminhando todos os dados pedidos pelo formulário da RBJA, os quais serão também utilizados, junto com tantos outros, para a organização das conferências locais e para a preparação da Conferência Nacional de Saúde e Meio Ambiente, prevista para outubro de 2009.

A luta continua!

(*) Fonte: AmbienteBrasil http://www.ambientebrasil.com.br/composer.php3?base=./educacao/index.php3&conteudo=./educacao/artigos/etica.html

Movimento contrário à construção do Porto das Lajes se reúne com a OAB-AM

Foto: Rogelio Casado - SOS Encontro das Águas - Manaus-AM, 20.02.2009

Ao centro: Oldeney Valente, presidente da Comissão de Meio Ambiente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados e a bióloga Elisa Wandeli, da AMANA - Associação Amigos de Manaus


Movimento contrário à construção do Porto das Lajes se reúne com a OAB-AM

20 de fevereiro de 2009.

MANAUS – Entidades diversas que juntas constituem grupo de oposição à construção do Porto das Lajes na região do Encontro das Águas, em Manaus, estão reunidos nesse momento com Oldeney Sá Valente, presidente da Comissão de Meio Ambiente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

O encontro iniciou por volta das 16h e conta com a participação do Núcleo de Cultura Política da Universidade Federal do Amazonas (NCPAM/Ufam), Associação Amigos de Manaus, Centro de Direitos Humanos da Igreja Católica de Manaus e lideranças da comunidade da Colônia Antônio Aleixo, um dos bairros que será afetado pelas obras.

Segundo o médico especialista em Saúde Mental Rogelio Casado, um dos fundadores da Associação Amigos de Manaus, a reunião tem como objetivo fazer a entrega de documentos relativos aos problemas ambientais que a execução da obra no local vai causar à fauna e à flora da região e estabelecer uma possível parceria com o órgão no sentido de impedir a execução das obras.

– Nós não somos contrários à construção do Porto das Lajes, mas contra à área onde se deseja fazer a construção. O Encontro das Águas representa a identidade da região. Ele é um patrimônio de Manaus, do Estado e do mundo.

Porto das Lajes

Localizado no quilômetro 17 da Alameda Cosme Ferreira, no bairro Colônia Antônio Aleixo, o empreendimento tem pelo menos 600 metros quadrados de projeto com valores de investimento na ordem de R$ 220 milhões.

No entanto, entidades afirmam que a obra vai comprometer de modo irreversível a integridade física e biológica do Encontro das Águas – um dos cartões postais da cidade de Manaus.

O objetivo do grupo de empresários por trás da obra, segundo informes oficiais, é possibilitar o atraque de grandes navios de carga no local e assim evitar que estes tenham de percorrer toda a orla de Manaus com produtos destinados ao Pólo Industrial de Manaus (PIM), desafogando o desembarque de mercadorias do Centro da cidade.

Fonte: Mário Bentes, especial para o Portal Amazônia

O Porto das Lajes e o IIRSA


fonte: http://www.rogeliocasado.blogspot.com


Encontro das Águas visto das Lajes - Manaus-Amazonas-Brasil
Nota do blog: Toda a área vista na imagem acima, no local conhecido como Lajes, onde encontram-se falésias com fósseis datados de milhões de anos, e que fica em frente do Encontro das Águas (patrimônio natural da humanidade), será afetada pelo porto que a Superintendência da Zona Franca de Manaus pretende construir logo a jusante. Ao centro, vê-se a torre da Embratel; ao lado, à direita, uma instituição nipo-brasileira responsável pelo reflorestamento de uma área degradada, que enche de vergonha o poder público, que não tem uma iniciativa igual em toda a orla do rio Negro, rio que banha a bela Manaus. Leia abaixo um outro ângulo da questão do Porto das Lajes que vem passando ao largo da discussão.

O Porto das Lajes e o IIRSA


Matéria assinada por Carlos Tautz, publicada no Le Monde diplomatique Brasil, edição de fevereiro, dá preciosas indicações sobre os interesses envolvidos em grandes projetos nas áreas de transporte, energia e comunicações na América Latina.

Segundo Tautz, cada um de seus eixos tem como objetivo “dotar a região de infraestrutura para extrair, em níveis nunca vistos, todo tipo de commodities, exportando-os para os mercados consumidores mais ricos”.

Ora, ora! explicado o projeto de construção do Porto das Lajes no Encontro das Águas do rio Negro com o rio Solimões, justamente onde ele passa a chamar-se rio Amazonas. Se é assustadora a previsão do impacto ambiental contra esse patrimônio da humanidade - não é à toa que os ambientalistas estão de cabelos em pé -, mais intrigante são os antecedentes históricos que dão sustentação a esse crime contra a humanidade.

Dando nomes aos bois

Tautz afirma que tais projetos nasceram com o objetivo de aproximar a América Latina dos pólos dinâmicos da economia capitalista, sendo denominado como Iniciativa de Integração da Infraestrutura Sul-americana (IIRSA). Autor da façanha: FHC.

Concebida no final dos anos 1990, só em agosto de 2000 Fernando Henrique Cardoso, presidente da república, chamou 11 outros colegas do continente – entre eles ditadores comprometidos por graves denúncias de corrupção, e até um que seria derrubado por um movimento popular sob a acusação de ter capitulado diante dos interesses dos Estados Unidos – para ditar o tom da nova agenda liderada pelos estrategistas neoliberais norte-americanos: radicalizar a liberdade de comércio.

O que nós, mortais comuns, acossados na luta pela sobrevivência no país recordista em impostos exdrúxulos não sabíamos é que por trás da idéia concebida pelo Brasil, e consolidada num trabalho elaborado pelos consultores do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), estava o indefectível Eliezer Batista, ex-presidente da Vale do Rio Doce e ex-ministro de assuntos estratégicos, agora um zeloso consultor a serviço da lógica neoliberal do Consenso de Washington.

Que curioso! O antropólogo Ademir Ramos, do Núcleo de Cultura Política do Estado do Amazonas, em entrevista ao Semanário Repórter, de Manaus, declara a propósito dos interesses envolvidos na construção do Porto das Lajes no Encontro das Águas, que tem na empresa Lajes Logística S/A seu preposto:

“A bem da verdade, a empresa estruturante desse empreendimento é a Vale do Rio
Doce, que desde 2001, por meio do seu executivo de frente, Sergio Gabizo, vem
gerenciando os contratos entre a Aliança Navegação e Logística Ltda. e a
Docenave, do grupo Vale do Rio Doce, que fecharam acordo na época para aumentar
a freqüência e o número de navios entre os principais portos do Mercosul
(Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai). As duas companhias estão entre as
maiores do setor de navegação do País, no transporte de contêineres a longa
distância e cabotagem. O concorrente desse mercado são as empresas de transporte
rodoviário. Mas, futuramente estarão compondo o consórcio. O que falta é
transparência, separando bem o público do privado e, sobretudo a cobrança sobre
as empresas quanto à sua responsabilidade social e ambiental”.

O que quer a IIRSA?

Bueno, até aí morreu Neves! Com os pilares do pensamento neoliberal abalados, por que os agentes políticos e econômicos não perderam o fôlego e ainda vicejam à sombra do decálogo do Consenso de Washington?

Para Tautz, nem Hugo Chavez – único presidente a emitir sinais de antipatia ao IIRSA, e que ajudou a sepultar a Alca (lembram dela?) – foi capaz de fazer análise mais minuciosa do que estava e está em jogo: a negociação de recursos naturais estratégicos.

Quem matou a charada foi a professora da Universidade Autônoma do México, coordenadora do Observatório de Geopolítica do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (Clacso), Ana Esther. Segundo Tautz, foi ela quem elaborou o mapa das zonas de influência da presença militar dos EUA na América Latina. Ao sobrepô-lo ao mapa da ocorrência de recursos naturais, percebeu que ambos coincidem.

Ora, ora! Assim estão explicadas as garantias oferecidas aos agentes econômicos, habituados a liberar recursos quando, apenas e tão somente, há certeza plena do retorno dos seus investimentos. Capice? Não bastam contratos a serem contestados nos tribunais, os agentes querem, também, outras seguranças, afirma Tautz.

Well! Nesse contexto, vale lembrar que o BID há décadas é presidido pelos EUA. Não é à toa que sobre ele recaiu a escolha para ser a secretária técnica e o captador de recursos junto a organismos financeiros regionais para ajudar o IIRSA.

Vai pensando aí. Voltaremos ao assunto.